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Ainda que não implique explicitamente o princípio das vidas vinculadas/ linked lives, a análise de impactos longitudinais permite evidenciar a causalidade de certos acontecimentos no passado e as suas repercussões posteriores no curso de vida dos indivíduos. Este efeito pode ocorrer na mesma esfera de vida ou entre esferas de vida de um indivíduo. A análise deste impacto permite captar como os acontecimentos de vida podem representar a (re)estruturação ou pontos de viragem nos cursos de vida. Evidencia ainda o efeito da interação entre características individuais e supra individuais, a acumulação de vantagens e desvantagens ao longo da vida, assim como a relação entre a agência e estrutura (Bernardi et al.2018).

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Exemplos: 

Efeito da entrada no mercado de trabalho ou de momentos-chave das relações íntimas/amorosas na saída de casa dos pais: Ainda que se desenvolva com a idade, o 1º emprego aumenta significativamente a probabilidade de um indivíduo sair de casa dos pais (Rossingnon et al., 2018), demonstrando o impacto da entrada do mercado de trabalho na transição para a vida adulta associada à “saída do ninho”. 

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Também o término de uma relação amorosa evidencia um potencial ponto de viragem nos cursos de vida, sobretudo, das mulheres mais escolarizadas/qualificadas em relação à saída de casa dos pais para situações de autonomia residencial, assim como, ainda que sub explorado, a saída precoce devido à orientação homossexual (Nico, 2016). 

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Acumulação e mobilização de capitais nas transições juvenis:Ingressar no ensino superior pode influenciar a formação e alargamento de redes sociais informais com consequências futuras no acesso a recursos e oportunidades através da acumulação e mobilização de capital social (i.e. o apoio, sobretudo emocional, através de laços fortes entre amigos e apoio, emocional e económico, dos laços familiares – bonding – e a instrumentalização de relações mais ténues/esporádicas e institucionais - bridging) contribuindo para valorização instrumental ou subjectiva das redes pessoas e ainda para a (re)estruturação social (Neves et al., 2019: 103-104).

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Desvantagens acumuladas de uma gravidez precoce: Os efeitos que uma gravidez ‘precoce’, agravados em situações de monoparentalidade, pode ter no abandono escolar das mulheres e, consequentemente, na sua exclusão no mercado de trabalho pela reduzida capacidade de empregabilidade derivada das suas baixas qualificações, acabando muitas vezes em empregos de baixo rendimento e estruturando processos de acumulação de desvantagens (Jaerhrling et al., 2014 em Struffolinoet al., 2018: 5).

 

Efeitos prolongados da transição escola-trabalho e do contexto socioeconómico nas oportunidade laborais: Ou ainda, considerando o estudo de Wolbers (2016), o impacto que a escolaridade alcançada poderá ter na empregabilidade no momento de entrada no mercado de trabalho em interação com as flutuações do mercado de trabalho, sobretudo em períodos de recessão com elevadas taxas de desemprego, e a sua repercussão na empregabilidade futura.

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Metodologia e Resumo

Procurando descobrir a causalidade de certos acontecimentos na vida presente e posterior dos indivíduos, a pesquisa de curso de vida tem incidido sobretudo em bases de dados longitudinais ou em compilação de informação por coorte, isto é, que se prolongam no tempo ao recolher informação em vagas contínuas e potencializado a análise de impactos longitudinais. Ainda que primando pela aplicação de metodologias quantitativas, pretendendo encontrar padrões de causalidade, “spill-over effects” ou ainda “turning points”, as pesquisas de curso de vida são frequentemente alicerçadas por metodologias qualitativas onde a perceção e subjectividade dos inquiridos em análise pode auxiliar o sentido da análise dos impactos longitudinais encontrados.

 

De forma sucinta, os impactos longitudinais são consequências de acontecimentos ao nível individual, influenciados pelo contexto, que se repercutem posteriormente na mesma esfera social e/ou se alastraram a outras, e que se devem, sobretudo, aos efeitos da interação entre os atributos intra individuais, individuais e supra individuais nos contextos de existência dos indivíduos ao longo dos seus cursos de vida, assim como a efeitos de acumulação de vantagens e desvantagens sociais ao longo da vida.

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Referências bibliográficas

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Bernardi, L., Huinink, J., & Settersten Jr, R. A. (2018). The life course cube: A tool for studying lives, Advances in Life Course Research.

 

Rossignon, F., Studer, M., Gauthier, J. A., & Le Goff, J. M. (2018), “Sequence history analysis (SHA): Estimating the effect of past trajectories on an upcoming event” em Sequence Analysis and Related ApproachesSpringer, Cham, 83 -100.

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Nico, Magda (2016), “Romantic turning points and patterns of leaving home: contributions from qualitative research in a southern European country”, European Societies, 18 (4), 389-409.

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Neves, B. B., Dias de Carvalho, D., Serra, F., Torres, A., & Fraga, S. (2019), “Social Capital in Transition (s) to Early Adulthood: A Longitudinal and Mixed-Methods Approach”, Journal of Adolescent Research, 34(1), 85-112.

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Jaehrling, K., Kalina, T., & Mesaros, L. (2014), “A paradox of activation strategies: Why increasing labour market participation among single mothers failed to bring down poverty rates”, Social Politics: International Studies in Gender, State & Society, 22(1), 86–110 em Struffolino, E., Bernardi, L., & Larenza, O. (2018). Lone Parenthood and Employment Trajectories: A Longitudinal Mixed-Method Study. LIVES Working Papers, 1-32.

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Wolbers, M. H. (2016) “A generation lost?: Prolonged effects of labour market entry in times of high unemployment in the Netherlands”, Research in Social Stratification and Mobility, 46, 51-59.

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Texto por Marco Carreira (2019)

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